Toquei a escuridão, senti-me noite sem luar, onde as estrelas se escondiam atrás da penumbra da minha ignorância. Meu rio de água suja corria encontrando-se com meu mar, um estuário perdido num encontro triste, alagada em minhas águas salgadas, ledo engano, inconsciente do santo ao profano, do paraíso ao inferno, meu íngreme jardim de inverno. Entre os becos das minhas entranhas, calava o silêncio com o som dos tormentos disfarçados de felicidade, onde os sorrisos eram bobos, tão bobos que o palhaço da corte se envergonhava. Onde foi parar minha dignidade? Fazia tempo que não nos encontrávamos, seria tão bom vê-la, talvez renovasse minhas forças para tentar me mover da areia movediça a qual me encontrava, afundada. Se diz que caminhamos com nossos próprios pés, mas há repugna das próprias mãos quando tocamos o impuro, os pés nos levam ao abismo, mas são as mãos que nos envergonham. Não é preciso descer ao fundo do poço para vermos o quão baixo somos, mas o discernimento nos acende a lâmpada da sabedoria e nos faz decidir entre o bem e o mal. É preciso ao menos querer encontrar-se para lavar as mãos sujas do nosso sangue frio, para quiçá aqueça nosso peito vazio, até sair deste meio fio, entre o céu e o vazio. Enquanto não houver a recusa de tudo o que te move ao ponto mais desastroso da alma, ficamos vulneráveis à nudez eterna, e isto será uma história triste, sem ter a quem contar.
Somente o amor pode mudar tal narrativa, porque por ele nos tornamos sensíveis a ponto de enojarmos das nossas ações contraditórias à vida até que possamos tocar a eternidade com nossas mãos limpas de qualquer ato iníquo que entristeça nosso braço eterno.
Por Patrícia Campos